Coral Aboios de Serrita: os poetas do sertão

 



Foi numa Missa do Vaqueiro, em Serrita-PE, que o menino Carlos Murilo, de 8 anos, descobriu que queria ser poeta. Vaqueiro, desde os 5 anos, integra a quarta geração de uma linhagem de sertanejos que ganha a vida tangendo rebanhos. Dos anos da infância, na “capital do vaqueiro”, motivado pelo pai, ficaria marcada a poesia de Vavá Machado e Marcolino, cantadores de aboios e toadas. 


O aboio, entoação melancólica e potente, é usado para chamar a boiada na caatinga. Já a toada são versos cantados parecidos com o cordel. É improvisado por duas ou mais pessoas sendo muito comuns os desafios entre poetas.


O menino sonhador se reconheceu nas cantorias sobre o cotidiano, a religiosidade do sertanejo e a vida do vaqueiro e se impressionou com a habilidade dos aboiadores em criar versos e rimas. Ele cresceu e, hoje, é o diretor do Coral Aboios, formado em Serrita, há 25 anos, e composto por 9 poetas aboiadores, em sua maioria vaqueiros ou descendentes, que correm pelos matos e mantêm alguma relação com a terra. Foram influenciados por um ambiente diverso de sentimentos e vivências, onde a espiritualidade é o elemento central. Nesse sentido, a Missa do Vaqueiro, celebrada há 53 anos, em memória do vaqueiro Raimundo Jacó, é o espaço de junção entre o aboio, a poesia e a fé. Diante do altar, os vaqueiros ofertam suas vestimentas, cantando versos improvisados, num ritual que eleva o vaqueiro à figura representativa de um povo. O Coral Aboios cantou durante 22 anos na Missa do Vaqueiro de Serrita e em outras missas pelo sertão nordestino.


Para além das celebrações religiosas, o grupo tem cantado em momentos profanos de festas do vaqueiro, tanto em Serrita como em outras localidades, em eventos culturais, festivais e shows. Subiram no mesmo palco que Quinteto Violado, Dominguinhos, Flávio Leandro, Targino Gondim e Delmiro Barros, levando Brasil à fora um acervo histórico, cultural e social que têm chamado a atenção de canais de televisão de alcance nacional. Outro veículo de difusão é o lançamento de álbuns bem recebidos pela crítica. Já são 5, além de 2 participações no álbum Rezas de Sol, com as músicas Toada de Gado e Tributo a Geraldo Regis. No repertório do Coral, aboios e toadas são cantados ora ao modo tradicional - à capela – ora acompanhados por sanfona, violão, triângulo e zabumba. “Nosso repertório é composto por músicas inéditas criadas pelos próprios membros do grupo, bem como por trabalhos de outros artistas que apresentam afinidade cultural com a gente”, explica Murilo.




Vaquejada no sertão 

Carlos Murilo



A melhor coisa do mundo é festa de vaquejada 

Começa de manhã cedo entra pela a madrugada

Vaqueiros correm na pista de fora as moças bonitas

Torcem da arquibancada


O vaqueiro se acorda na maior animação 

Vai pegar o seu cavalo veste perneira e gibão 

Logo vai botando a cela ligeiro passando a perna 

Para casa do patrão 


Lá encontra seus amigos e os companheiros de estradas

que lutam na vida do gado que não temem quase nada

São destemidos e fortes desafiam a própria morte 

dentro da mata fechada


Tudo isso se completa no parque de exposição 

Onde tem mulher bonita gente de todo sertão 

Lá tem forró tem agito

Vaqueiro soltando grito de doer no coração 


As coisas da minha terra tem muito pra gente ver

Cavalo e festa de gado é mesmo pra derreter

É tradição no Nordeste isso já mais se esquece 

Com ela ei de morrer


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