Em Os Segredos da Ficção, Raimundo Carrero aponta o trabalho árduo como caminho para a criação de universos ficcionais





Em Os segredos da Ficção – um guia da arte de escrever narrativas, Raimundo Carrero traz uma boa notícia para os aspirantes a escritores: qualquer pessoa pode escrever um bom romance. A outra notícia, talvez, não agrade tanto. É que para alcançar esse objetivo é preciso trabalhar, diariamente, como um operário, cumprir horários e derramar muito suor.


Se, antes, o melhor amigo do escritor era a lixeira, hoje, é a tecla “deletar” do computador. Delete e reescreva, quantas vezes for necessário, sem medo do fracasso, tomando cada erro como um incentivo. Tenha paciência, portanto, e esqueça a inspiração. Escrever exige uma atitude racional que, nem por isso, limita a criatividade. Para Carrero não existe inspiração, existe, sim, um material disforme a ser elaborado ou, ainda, uma manifestação do inconsciente, que ele define como o acúmulo de observação e experiência. Algo de muito profundo no espírito do escritor, pedindo para vir à superfície, a exemplo do processo de criação de A história de Bernarda Soledade, a tigre do sertão, quando as personagens femininas revelavam, progressivamente, um caráter de familiaridade, como se um conteúdo emergisse do inconsciente. “Não era inspiração, nunca foi. No inconsciente, todas as minhas irmãs começaram a se movimentar. Por isso é fácil distinguir o rosto delas em cada uma (das personagens)”.


Num tom de intimidade com o leitor, quase um olho no olho, esses e muitos outros conhecimentos são compartilhados por quem é autor de 22 livros, recebeu importantes prêmios de literatura e ministra, desde 1998, sua própria oficina de romance, em Recife-PE, que revelou escritores nacionalmente conhecidos e premiados.


Os segredos da ficção é uma oficina em formato de livro. A voz narrativa, o processo criador e a construção do personagem, em seus diversos aspectos, estão sistematizados de uma forma leve e exemplificados para o melhor entendimento do leitor. Traz conselhos fundamentais apreendidos dos clássicos da literatura e dos estudiosos do romance. Aliás, as últimas páginas trazem uma bibliografia comentada, de leitura obrigatória para os que perseguem a escrita como ofício.


Carrero nos chama a atenção para um mergulho na leitura desses autores, na gramática, em especial, na pontuação, e na técnica. Sugere separar um momento para escrever e outro para estudar. Estudar, estudar mais e aprender para, então, conscientemente, desobedecer todas as regras e conselhos aprendidos. Ele explica que repetições e desobediências gramaticais não são apenas possíveis, mas exigidas. Tudo com método. Um conceito que permeia toda a leitura de Os segredos da ficção.



Raimundo Carrero – Nasceu em 1947, na cidade de Salgueiro, no miolo do sertão pernambucano, em um contexto religioso muito forte e trabalhou, por mais de duas décadas, como repórter de um jornal impresso. Os temas presentes em sua obra são coletados a partir do noticiário, da própria experiência e da observação e, muitas vezes, estão relacionados a sua cidade natal.


Escreveu cerca de de 22 obras que lhe renderam prêmios literários relevantes, como os prêmios José Condé, Governo de Pernambuco (1984), Lucilo Varejão, prefeitura do Recife (1986), Revelação Nacional, Rio Grande do Sul (1987), Troféu APCA de Melhor Romancista do Ano, Prêmio Machado de Assis (1995), Prêmio São Paulo de Literatura – Melhor Livro do Ano (2010) e vencedor pela segunda vez do Troféu APCA como Melhor Romancista do ano (2015).

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